eu sempre ouço
“não se pode ter tudo, taila…”
na voz das coisas mundanas.
hoje foi uma tela serigráfica que me disse isso.
sábia matriz,
de ranhuras difíceis.
arte é imagem pensante.
existe vida pública
e vida privada
existe iniciativa privada
mas de iniciativa pública
eu nunca ouvi falar
você já pensou que lindo seria
a iniciativa popular?
o poder é público,
a iniciativa é privada
isso talvez explique
a merda generalizada
poeminha de vingança ficcional
queria ver o teu rosto
enquadrado
emoldurado
talvez até no jornal
queria, bem na verdade,
ver tua cara estampando
a manchete principal
desde que o assunto fosse
de caráter criminal
queria te ver algemado
na página policial
leria com calma e alegria
enquanto faço um nescau
Haja resistência
Pra emergência da vida
Esse chuveiro queimado,
Essa cobrança indevida
Haja força de espírito
Haja remédio
Pra tanta ferida
Minha nossa, quem diria!
Caminhando pela rua
Pisei em algo macio…
Só pode ser poesia!
(Para Juliana Maffeis, mas com menos molejo… :))
Fácil
Eu vejo beleza…
nas folhas mortas
nos rostos tristes
nos dias cinzas
Eu vejo graça
nas coisas tortas
e mesmo em chistes
que não fazem rizas
O cheiro do café
é suficiente
pra me aquecer
Qualquer cafuné
e já conseguiram
me amolecer
Conversa entre duas estudantes de artes…
– e aí?
– de bowie
– e o abapuru, tudo bem?
– anda bem antropofágico…
– menos detalhes, por favor!
made in china
às vezes as situações indigestas
vêm embrulhadas e se apresentam
como calcinhas de sacoleiras,
espalhadas pelo sofá
pras cumadre esprementá
a gente compra,
elas apertam,
a lycra às vezes corta
mas elas são bonitas
vêm com aquele lacinho rosa bagaceiro
que as nossas tias acham a nossa cara…
também se aproximam
pelos fatores familiaridade e recorrência.
sim, e a cada ano que passa
a qualidade só piora.
Eu falo português fluentemente
A fome em que língua fala eu não sei.
Eu só sei que às vezes eu falo com a fome…
E a fome sempre fala à minha língua
Que a fome nada engana nem ninguém.
A vida da gente repousa em caixas de acrílico, do lado de fora dos bolsos e bolsas, enquanto passamos por portas magnéticas. Retornam, confusas, aos lugares que a pressa os colocou, as senhas, as chaves, as moedas.